terça-feira, 23 de julho de 2013

Vasco da Gama, Navegador Exímio e posteriormente Conde da Vidigueira



Introdução


Todos nós sabemos que Vasco da Gama descobriu, em 1498, o caminho marítimo para a Índia, feito que marcou o curso da História Mundial. O seu nome percorreu a Europa de então. A sua valentia e capacidade de liderança ditaram um feito ímpar. O genovês Cristóvão Colombo, ao serviço da Coroa Espanhola, bem tentara alcançar o Paraíso das Especiarias e demais preciosidades orientais, mas estava escrito no Céu que seria um grande português a concretizar essa façanha. 
Agora o que nem toda a gente sabe, é que este ilustre senhor foi posteriormente Conde da Vidigueira entre 1519-1524, tendo mesmo residido nos Passos do Castelo, cujas ruínas ainda podem ser vistas actualmente (apenas uma antiga torre permanece bem conservada, o resto desapareceu com a erosão do tempo e o vandalismo humano). Contudo, vamos começar por traçar a sua célebre carreira, de forma sintetizada, desde o seu nascimento até ao momento em que ele entra triunfantemente no novo Condado, sendo acolhido entusiasticamente pelo povo que se sentia honrado por ter uma figura tão conceituada à frente dos seus destinos.


1- Vasco da Gama - Início da sua Vida e a Epopeia da Índia 


Vasco da Gama nasceu em 1469 na localidade de Sines. Era filho de Estevão da Gama (1430-1497), alcaide-mor de Silves e Sines, para além de ter sido Mestre da Ordem de Santiago. Desconhecem-se os primeiros anos de vida de Vasco da Gama. Lança-se a possibilidade de ter estudado matemática e astronomia em Évora, mas nada está claramente provado. Sabemos que, por volta de 1480, segue as pisadas de seu pai e ingressa na Ordem de Santiago. Em 1492, está a seguir as ordens de D. João II que manda atacar ou capturar navios franceses, dado que estes não estariam a respeitar as condições inerentes ao período de paz então estabelecido. Vasco da Gama terá começado a dar provas da sua real capacidade nesta precisa ocasião, tendo merecido a confiança do rei D. Manuel I que governa a nação a partir de 1495 e que não hesitará em confiar-lhe o cargo de capitão-mor da frota que zarpará de Belém, em 8 de Julho de 1497, rumo à Índia. A expedição, constituída por quatro naus e cerca de 170 homens, era meramente exploratória. O objectivo passaria por estabelecer relações políticas e comerciais favoráveis com os povos do Oriente. Durante o longo e penoso percurso, os portugueses tiveram que fintar inúmeras adversidades (tempestades e a hostilidade dos muçulmanos) para conseguirem alcançar a tão desejada Índia, o palco de todos os sonhos daquela época!
A 20 de Maio de 1498, a frota atinge finalmente Calecute, ficando aberto o caminho marítimo dos europeus para o Oriente Asiático. Vasco da Gama procura agora vantagens comerciais junto de Samutiri Rajá, Samorim de Calecute (o título de Samorim era atribuído ao mais alto representante hindu daquele Estado). Contudo, os produtos transportados pelos portugueses para eventuais trocas não impressionaram o Samorim nem os seus representantes, muito menos, os mercadores árabes que aí se encontravam e temiam este cenário de concorrência indesejada. Todavia, Samutiri parece ter ficado agradado com as cartas de D. Manuel I, e por isso, acabou por autorizar Vasco da Gama a comercializar naquela região, tendo este obtido uma carta de concessão de direitos. O nosso navegador, antes de regressar ao reino para transmitir as novidades, dá mesmo ordens a alguns portugueses que aí permaneceriam para assegurar a criação duma nova feitoria. A viagem de regresso começou no dia 29 de Agosto de 1498. O retorno será mais penoso e fatal. As tempestades e o escorbuto levarão muitos dos seus homens à desgraça. Dos 148 homens que integravam esta armada, só 55 regressariam sãos e salvos a Portugal. Paulo da Gama, irmão mais velho de Vasco da Gama, é um dos que tem o azar de falecer, tendo adoecido e terminado os seus dias na Ilha Terceira. Apenas 2 embarcações chegariam ao fim deste arriscado trajecto. Vasco da Gama chegava a Portugal em Setembro de 1499, assegurando, pelo menos, o seu legado para o futuro da Humanidade.
Ele foi recompensado com títulos, nomeadamente os de Dom e Almirante-mor dos Mares da Índia. Receberia agora uma renda anual de trezentos mil réis anuais.
A 12 de Fevereiro de 1502, enceta a sua segunda viagem rumo à Índia. Desta feita, estamos perante uma frota com 20 navios de guerra. Agora, o objectivo passava por impor os interesses portugueses a bem ou a mal. Quando regressa à Índia, tem conhecimento de que os portugueses aí deixados para criar uma feitoria, foram mortos. Tal obrigou Vasco da Gama a bombardear intensamente Calecute, destruindo os postos de comércio árabes. Posteriormente, ruma até Cochim, reino rival do anterior Estado, e aí será bem recebido, o que lhe permitiu regressar, em breve, à Europa com ouro e seda. Fundará aí uma colónia portuguesa. Entretanto, nova guerra estala entre Calecute e Cochim. Vasco da Gama, talvez em apoio destes últimos, derrota as forças navais do Samorim de Calecute e obriga este a retratar-se e a assegurar novas concessões comerciais favoráveis aos portugueses. Em Setembro de 1503, Vasco da Gama regressa triunfante! Agora, era altura, de repousar alguns anos no seu reino de origem e tentar ser agraciado com novos títulos.


Ficheiro:Vascodagama.JPG

Imagem nº 1 - A chegada de Vasco da Gama a Calecute (Índia) em 1498!



Vasco da Gama - Conde da Vidigueira e Vice-Rei da Índia


Vasco da Gama, agora estabelecido no reino de Portugal, passa algum tempo em Évora. Tenta instalar-se em Sines, mas não será bem recebido. Ele desejava obter um importante título aristocrático, a nível nacional. Chegará mesmo a demonstrar sinais de impaciência, ameaçando rumar a Espanha. De forma a evitar este lamentável cenário, o rei D. Manuel I e o Duque D. Jaime (senhor da Casa de Bragança e até então detentor das Vilas da Vidigueira e de Frades) viabilizam as intenções do reputado navegador. É certo que Vasco da Gama terá de abdicar da tença anual de 400 000 réis que recebia da Coroa e foi obrigado a despender mais 4 000 cruzados de ouro para obter o seu direito ao recém-criado Condado da Vidigueira. No dia 29 de Dezembro de 1519, é oficializada a sua tomada de posse, na altura, com o licenciado Estevão Lopes a representá-lo nas cerimónias solenes. Certo é que nos meses iniciais de 1520, Vasco da Gama e sua família (é justo ressalvar o papel de sua mulher - Catarina de Ataíde) mudam-se para a Vidigueira. É plausível que se tenham instalado no Castelo que já existia desde os finais do primeiro quartel do século XV. O povo terá recebido bem o seu novo senhor. Aliás, a Vidigueira tinha visto o seu estatuto a ser elevado a Condado. O orgulho e a honra estavam bem patentes na população vidigueirense daquele tempo. Por seu turno, Vasco da Gama alcançava um novo título aristocrático invejável (era conde!), para além, de ter a oportunidade de repousar nas terras calmas do Alentejo (ele já tinha 50 anos, tendo passado por muitas adversidades, nos inúmeros momentos em que serviu heroicamente o seu País).
O recém-instituído Conde da Vidigueira terá oferecido o sino da Torre do Relógio que ainda hoje se conserva em bom estado na Vidigueira. Terá ainda demonstrado uma fervorosa afeição pelo Convento de Nossa Senhora das Relíquias, mantendo relações cordiais com o prior e os frades. Não será de estranhar que Vasco da Gama tenha sido posteriormente sepultado neste espaço.
Infelizmente, não sabemos muito mais sobre a sua acção na Vidigueira. É certo que não ficará aqui muito tempo, pois em 26 de Janeiro de 1524, é nomeado Vice-rei da Índia e para lá, terá de partir. A corrupção e os interesses individuais grassavam nos altos organismos portugueses do Oriente. O monarca D. João III sabia que Vasco da Gama, apesar de ser um homem com mão de ferro, procurava ser honesto e lutar contra muitos dos vícios. Era pois a personalidade mais indicada para inverter o rumo dos últimos acontecimentos. O prestígio em torno do cargo de vice-rei já tinha conhecido melhores dias. Vasco da Gama preferiu renunciar ao descanso e à paz que satisfaziam a sua alma, para mais uma vez, defender os interesses da pátria em territórios tão longínquos e perigosos. A idade já não perdoava, mas mesmo assim, aceitou o desafio em nome do país que tão exemplarmente servira. Vasco da Gama viajaria para nunca mais voltar. Chegara a Goa em 11 de Setembro de 1524, mas o seu governo não chegou a durar sequer quatro meses. Por motivos naturais, faleceria em Cochim no dia da véspera de Natal desse mesmo ano. Não fora o único Gama a morrer enquanto servia a Pátria. Os seus filhos Paulo da Gama (tomba em 1534 diante do Sultão de Ugentana) e D. Cristóvão da Gama (capturado e executado em 1542, como mártir, na Etiópia, pois não renegou à fé cristã) também terminariam os seus dias no Oriente. Também o seu neto, Vasco Luís da Gama, terceiro conde da Vidigueira, faleceria na batalha de Alcácer Quibir (1578), quando lutava ao lado de D. Sebastião. O seu bisneto Jorge da Gama (e filho do já mencionado terceiro conde da Vidigueira) seria morto em 1586, quando integrava uma armada que fora arrasada pelos Niquilus.
O sangue de muitos Gamas ficaria assim derramado em terras do Oriente, visto que pelejaram pela causa cristã e ainda zelaram pelos interesses nacionais.
Em 1538 ou 1539, os restos mortais de D. Vasco da Gama foram trasladados para Portugal, mais concretamente para o Convento de Nossa Senhora das Relíquias, na Vidigueira. Em 1880, dá-se nova trasladação, desta feita, para o Mosteiro dos Jerónimos (Lisboa). É claro que surgiram algumas dúvidas quanto à eficácia dessa transferência dos restos mortais, tendo sido levantada a hipótese de ter existido alguma confusão, mas de acordo com José Palma Caetano, tudo não passará dum mito. A trasladação, com a maior ou menor dificuldade, terá sido devidamente realizada.
Mas ninguém poderá jamais negar a grandeza de Vasco da Gama bem como a sua apreciável passagem pelas terras da Vidigueira e Vila de Frades.




Imagem nº 2 - Estátua de Vasco da Gama na Vidigueira. Esta foi inaugurada em 1970. A praça, onde se pode visualizar tal escultura, acolheu o nome do seu navegador. 
Retirada de: http://www.waymarking.com/gallery/image.aspx?f=1&guid=b148f118-addc-4167-93d7-609da0cd8370&gid=3, (autoria de Paulo Jota)

Na legenda desta Estátua pode ler-se:

Dom Vasco da Gama
1469-1524

Descobridor e Almirante do Mar da Índia
1º Conde da Vidigueira
Vice-Rei da Índia

"Aquelle illustre Gama,
Que para si de Eneas toma a fama"
(CAMÕES, Luís, 1572)



Por fim, dedico, em sinal da minha sincera homenagem, o seguinte poema a este nobre lusitano:



Vasco da Gama, o herói nacional
(Poema da autoria do Mensageiro da Vidigueira)


O nosso encorajado navegador,
Superando tempestades e demais adversidades
Que semeavam, na armada portuguesa, um total pavor,
Encontrava o caminho para a tão desejada Índia das preciosidades!


Por Portugal, ele terçou armas,
Ordenou a criação de feitorias
Para a transacção das mais cobiçadas mercadorias,
Mas alguns invejosos tentaram colá-lo ao grupo dos catarmas.


Vasco poderia ser severo e intolerável,
Mas combatia a conspiração e a corrupção,
O que o tornavam aos olhos do rei, um homem admirável
Capaz de gerir, no exterior, os assuntos do País com a necessária isenção.


Morreria no País que lhe asseguraria a fama!
Na famosa Índia, sonhada pelos grandes mercadores!
Mas apenas atingida pela ousadia do Gama
Que abriu lugar a novos amores.


Ele não só divulgou a língua portuguesa,
Como escreveu uma página de ouro na Náutica,
Através da sua ambição e destreza,
Que lhe granjearam uma grandeza automática.


Ah! Como ele é adorado no seu antigo Condado,
A Vidigueira assegurou-lhe sempre o repouso e a oração,
A sua marca está presente no Convento de Nossa Senhora das Relíquias,
Pelo qual sempre mostrou uma tremenda devoção,
A torre do relógio tem, por si, um sino encomendado;
Com este vulto, certamente se atingiram todas as fasquias!


PS: Um catarma é normalmente uma vítima expiatória, isto é, alguém que costuma ser objecto de desprezo. Todos sabemos que Vasco da Gama, pelo seu carácter autoritário e quiçá implacável nos momentos mais críticos, ganhou vários inimigos, muitos destes talvez interessados nos seus objectivos pessoais e não dos da Nação. Não seria o único a fazer parte do grupo dos catarmas ou dos bodes expiatórios, mas a História julgou-o como um dos aventureiros mais bem-sucedidos de sempre! Quanto maior é a grandeza do homem, também a inveja proveniente de outrem tenderá a aumentar!
Quanto ao termo "novos amores", é certo que a miscigenação entre portugueses e indianas foi também uma realidade nas futuras colónias orientais. Procurei dotar este poema com alguma paixão, pois desenvolveram-se laços interessantes entre as duas civilizações, caracterizadas por valores culturais distintos.



Bibliografia Consultada:

  • CAETANO, José Palma - Vidigueira e o seu Concelho. 2º Ed. Beja: Câmara Municipal da Vidigueira, 1994, p. 87-99.
  • ALVES, Ivone Correia - Gamas e Condes da Vidigueira. Percursos e Genealogias. Lisboa: Edições Colibri, 2001, p. 163-168.
  • http://www.infopedia.pt/$vasco-da-gama, Infopédia - Página Consultada em 23/07/2013.
  • http://www.vidaslusofonas.pt/vasco_da_gama.htm, (23/07/2013 - artigo da autoria de Fernando Correia da Silva).
  • Wikipédia.

Sem comentários:

Enviar um comentário