sábado, 12 de outubro de 2013

A Exposição de Gonçalves Correia no Museu Casa do Arco (Vila de Frades)

Infelizmente, a afluência não foi tão significativa como era expectável. Apenas 29 pessoas compareceram na Exposição Rotativa. Foram oferecidos livrinhos sobre esta personalidade aos visitantes. Por isso, quem não apareceu, não soube o que perdeu. Mas o maior destaque vai mesmo para o Exmo. Sr. Prof. Dr. Marcelo Rebelo de Sousa que foi um dos que esteve presente na Casa do Arco, demonstrando mesmo simpatia e respeito pelo pensamento de Gonçalves Correia. É ainda possível que esta personalidade notável faça uma referência sobre esta exposição de Vila de Frades, no telejornal da TVI deste Domingo, onde assume um evidente protagonismo. Por isso, estejam atentos!
Resumindo agora um pouco a história de Gonçalves Correia, podemos dizer que este erudito nasceu em S. Marcos da Ataboeira (Concelho de Castro Verde) em 1886. Viveu um casamento feliz com Ana do Carmo, e por isso, teve 10 filhos na sequência dessa relação amorosa. Em termos ideológicos, começou por ser republicano, mas em 1911 (quando já tinha 25 anos), enveredou pelo anarquismo, embora numa vertente pacífica e extremamente liberal. Colaborou em diversos jornais. Criou a Comuna da Luz no Vale de Santiago, em Odemira, o que o aproximou também um pouco da visão comunista.
Por defender teorias polémicas no seu tempo, foi preso, por algumas vezes. Mesmo assim, a sua devoção pela liberdade, levou-o a apoiar as candidaturas de Norton de Matos e Humberto Delgado para as eleições Presidenciais de 1949 e 1958 respectivamente. Seria por isso também um alvo do Estado Novo.
Faleceria em Carnaxide, no ano de 1967.
Do pensamento de Gonçalves Correia, é de louvar a sua dedicação pela liberdade, igualdade económica, fraternidade, tolerância, justiça, naturismo. Defendia pois uma sociedade sem propriedade privada, salariato e poder político, acreditando que seria possível todos entenderem-se entre si e prestarem solidariedade mútua. 
Evidentemente, nos dias de hoje todo este pensamento não passaria duma utopia (isto é, desejo irreal), pois é necessária a existência de autoridades e duma hierarquia que assegurem o mínimo de ordem no País. Por isso, esta Exposição foi designada como - Gonçalves Correia - a utopia de um cidadão
Mesmo assim, decidi partilhar alguns dos pensamentos do autor, que considero os mais interessantes e que seguramente originariam muitas reflexões:


Carta a um Republicano

"Antes do 5 de Outubro, já o meu espírito pairava por outras regiões. Porquê? Porque compreendera já que isto de repúblicas e monarquias é coisa muito parecida. É certo que os olhos se me inundaram de lágrimas de alegria no 5 de Outubro. Mas é igualmente certo que essa alegria foi quase momentânea porque dias depois, horas depois, momentos depois do triunfo da rebeldia popular, já eu via o negro interesse pessoal a manchar os intuitos puríssimos dos idealistas"


O Casamento - Carta a uma mulher


"O Casamento! A grande comédia! A insigne imoralidade. Compare-se, compare-se o casamento, esse acto de submissão aos preconceitos sociais, com esse outro acto natural, digno, plausível, que é a união livre de dois seres que se querem e que o afecto prende. Como há-de aceitar-se o casamento sem pensamentos de revolta? E o casamento religioso? Esse então, muito pior do que o casamento civil! Pois haverá coisa mais irracional do que proclamar indissolúveis duas criaturas que amanhã, por questões de educação, de temperamento ou por quaisquer outros motivos, podem aborrecer-se?"


Maldita Guerra

"Quem lucra com as guerras? Os grandes! Quem perde? Os pequenos. 
Os endinheirados, sócios de fábricas de canhões, de correame, de metralha vária, os fornecedores de exército, são os parceiros que ficam sempre garantidos no jogo. Os pequenos ficam apodrecendo no campo negro das batalhas e agonizando dentro dos hospitais de feridos...
Maldita guerra! Malditas guerras! Oxalá que esta seja a última e que os homens do futuro, as criancitas de hoje, quando lhes entreguem as armas de rapina e do incêndio, possam e saibam dizer: "Este aço fabricou-se para o crime. Vai agora transformar-se em instrumentos agrícolas e industriais, coisas de que muito carecemos para a nossa felicidade".


Castigar ou Perdoar

"A Sociedade Burguesa fomenta este estado de coisas. O Estado mete na cadeia uma criança que rouba um pão. Não tolera. Não quer saber circunstâncias condutoras. O facto deu-se? Castigo! Cadeia! Vingança! O Estado tem a cadeia para castigar os que erram. Mas não tem escolas modelo para ensinar a vida honesta. (...) A sociedade burguesa não perdoa (...) O castigo fomenta o ódio. O perdão fomenta o amor. Perdoemos, pois (...). A nossa missão deve ser bem outra. Tem de ser esta: Perdoar os erros dos nossos semelhantes e procurar evitar que esses erros se repitam de futuro (...)"



4 Textos da autoria de Gonçalves Correia




Fotos da Exposição no Museu da Casa do Arco - Vila de Frades:








Apesar de só terem comparecido 29 pessoas, é verdade que o Museu foi recompensado com a visita inesperada e agradável do Exmo. Prof. Dr. Marcelo Rebelo de Sousa, personalidade bem conhecida dos portugueses que poderá referir-se a Vila de Frades, no próximo telejornal de Domingo (TVI), onde tem uma participação especial! 





Referência a Consultar - BICHO, Francisca; VIEIRA, Conceição - Gonçalves Correia - a utopia de um cidadão. Beja: Biblioteca Municipal de Beja - José Saramago/Câmara Municipal de Beja, 2013.

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